domingo, junho 13, 2010

Ferreira Gullar - Poemas

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Nascido em São Luis do Maranhão, em 1930, Ferreira Gullar, procurou apontar em sua obra a problemática da vida política e social do homem brasileiro.

De uma forma precisa e profundamente poética traçou rumos e participou ativamente das mudanças políticas e sociais brasileiras, o que lhe levou à prisão juntamente com Paulo Francis, Caetano Veloso e Gilberto Gil em 1968 e posteriormente ao exílio em 1971 .

Poeta, crítico, teatrólogo e intelectual, Ferreira Gullar entra para a história da literatura como um dos maiores expoentes e influenciadores de toda uma geração de artistas dos mais diversos segmentos das artes brasileiras.




Um pouco acima do chão,
1949

A luta corporal, 1954

A luta corporal e
outros poemas, 1956

Poemas, 1958

João Boa-Morte, cabra
marcado pra morrer
(Cordel), 1962

Quem matou Aparecida
(Cordel), 1962

Dentro da noite veloz, 1975

Poema sujo, 1976

Na vertigem do dia, 1980

Toda poesia, 1980

Crime na flora ou
Ordem e Progresso, 1986

Barulhos, 1987

Muitas Vozes, 2000



Teoria do não-objeto, 1959

Cultura posta em questão, 1965

Vanguarda e
subdesenvolvimento, 1969

Uma luz no chão, 1978

Sobre arte, 1982

Etapas da arte
contemporâneas, 1985

Indagações de hoje, 1989

Argumentação contra
a morte da arte, 1993



Se correr o bicho pega,
se ficar o bicho come
(c/ Oduvaldo Vianna, 1966

A saída ? Onde fica a saída ?
(Grupo Opinião), 1967

Um Rubí no umbigo , 1979

Dr. Getúlio, sua via e sua glória
(c/ Dias Gomes), 1968

Vargas
(nova versão de Dr. Getúlio)
1982



A estranha vida banal, 1989



Cidades Inventadas, 1997









Arte Pau Brasil

Livraria Loyola

Livraria Saraiva

Livraria Siciliano

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"Quando surge uma idéia, vou para a rua. Tenho prazer em conceber o poema no meio das pessoas que passam e nem suspeitam que ali, naquela hora ele está nascendo"

§

"Quando o poema chega, é um acontecimento inusitado, uma erupção, como um vulcão. Está tudo bem e de repente ele começa a colocar fogo pela boca."

§

"Posso fazer dez poemas por dia, porque eu sei fazer. Mas nunca farei isso. Eu sempre fui assim, sempre escrevi o poema necessário."

§

"A poesia não fala de tudo. Existe uma parte da vida sobre a qual a poesia não fala, mas eu também sou essas outras coisas."

(publicadas na revista Cult, nº 3
em outubro de 1997)









































































































































































POEMA

Se morro
universo se apaga como se apagam
as coisas deste quarto
se apago a lâmpada:
os sapatos - da - ásia, as camisas
e guerras na cadeira, o paletó -
dos - andes,
bilhões de quatrilhões de seres
e de sóis
morrem comigo.

Ou não:
o sol voltará a marcar
este mesmo ponto do assoalho
onde esteve meu pé;
deste quarto
ouvirás o barulho dos ônibus na rua;
uma nova cidade
surgirá de dentro desta
como a árvore da árvore.

Só que ninguém poderá ler no esgarçar destas nuvens
a mesma história que eu leio, comovido.


MAU DESPERTAR

Saio do sono como
de uma batalha
travada em
lugar algum

Não sei na madrugada
se estou ferido
se o corpo
tenho
riscado
de hematomas

Zonzo lavo
na pia
os olhos donde
ainda escorre
uns restos de treva.

(agosto 1977)



EVOCAÇÃO DE SILÊNCIOS

O silêncio habitava
o corredor de entrada
de uma meia morada
na rua das Hortas

o silêncio era frio
no chão de ladrilhos
e branco de cal
nas paredes altas

enquanto lá fora
o sol escaldava

Para além da porta
na sala nos quartos
o silêncio cheirava
àquela família

e na cristaleira
(onde a luz
se excedia)
cintilava extremo:

quase se partia

Mas era macio
nas folhas caladas
do quintal
vazio

e
negro
no poço
negro

que tudo sugava:
vozes luzes
tatalar de asa

o que
circulava
no quintal da casa

O mesmo silêncio
voava em zoada
nas copas
nas palmas
por sobre telhados
até uma caldeira
que enferrujava
na areia da praia
do Jenipapeiro

e ali se deitava:
uma nesga dágua

um susto no chão

fragmento talvez
de água primeira

água brasileira

Era também açúcar
o silêncio
dentro do depósito
(na quitanda
de tarde)

o cheiro
queimando sob a tampa
no escuro

energia solar
que vendíamos
aos quilos

Que rumor era
esse ? barulho
que de tão oculto
só o olfato
o escuta ?

que silêncio
era esse
tão gritado
de vozes
(todas elas)
queimadas
em fogo alto ?

(na usina)

alarido
das tardes
das manhãs

agora em tumulto
dentro do açúcar

um estampido
(um clarão)
se se abre a tampa.





POEMAS PORTUGUESES ( 4 )

Nada vos oferto
além destas mortes
de que me alimento

Caminhos não há
Mas os pés na grama
os inventarão

Aqui se inicia
uma viagem clara
para a encantação

Fonte, flor em fogo,
quem é que nos espera
por detrás da noite ?

Nada vos sovino:
com a minha incerteza
vos ilumino



PRIMEIROS ANOS

Para uma vida de merda
nasci em 1930
na rua dos prazeres

Nas tábuas velhas do assoalho
por onde me arrastei
conheci baratas, formigas carregando espadas
caranguejeiras
que nada me ensinaram
exceto o terror

Em frente ao muro negro no quintal
as galinhas ciscavam, o girassol
Gritava asfixiado
longe longe do mar
(longe do amor)

E no entanto o mar jazia perto
detrás de mirantes e palmeiras
embrulhado em seu barulho azul

E as tardes sonoras
rolavam
sobre nossos telhados
sobre nossas vidas .
Do meu quarto
ouvia o século XX
farfalhando nas árvores lá fora.

Depois me suspenderam pela gola
me esfregaram na lama
me chutaram os colhões
e me soltaram zonzo
em plena capital do país
sem ter sequer uma arma na mão.

(Buenos Aires, 1975)

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